Eu vi seu espírito, e confesso que nunca senti uma dor como aquela. O que leva um anjo a se achar menos que outro?
éfrera o mediu cuidadosamente. Já o estudara antes, e sabia os movimentos quase mecanicos que faria, para atacar e se defender.
- O que a traz aqui? Já se decidiu? – perguntou, afastando com brusquid?o uma humana da qual se servia como brinquedo, sob os olhares vazios das outras mulheres e das demianas que estavam abandonadas contra uma parede, no grande sal?o do trono.
éfrera olhou tudo aquilo, e ficou enojada.
éfrera olhou as duas demianas e as oito mulheres humanas, trapos submetidos, e seu cora??o doeu. Elas estavam nuas num lado do aposento. Uma delas, uma das demianas, tinha o olhar vazio dos desesperan?ados. Talvez fosse ela a que mais a afetava, porque a conhecia desde a queda. Como podia um anjo se deixar submeter de tal forma a outro anjo? Até mesmo às humanas n?o se justificava. Brinquedos, era só a isso que ele as reduzira.
- Isso aqui já está me incomodando há muito tempo. Vou cumprir a miss?o, mas assumi uma outra, antes dela.
- E qual seria essa nova miss?o? N?o me lembro de ter te dado alguma outra.
- N?o sou sua serva, nem sua guerreira. Na verdade, HasMut, serei a sua carrasca. Você n?o vai mais submeter qualquer demiana, qualquer anjo ou mesmo qualquer humana. Você n?o é um anjo, mas um dem?nio disfar?ado. E sabe, HasMut, eu gosto de tratar dos assuntos quando dem?nios est?o envolvidos.
HasMut a observou com desprezo e arrogancia.
- Você n?o imagina o que posso fazer. Ent?o eu te aconselho a ir embora. Vá cumprir sua miss?o, e talvez eu te perdoe.
- Quando é que passou a acreditar que é o que finge ser?
- Você é uma louca, como sempre pensei. Agora, vá e cumpra a sua miss?o – falou, a voz dura e irritada.
- Você precisa acordar, Amenel – falou desconsiderando HasMut totalmente, focalizando naqueles olhos amortecidos daquela que um dia chamara de amiga. – N?o desista de você mesma.
Suspirou fundo, ao ver os olhos da demiana se mostrarem ainda mais adormecidos. Deu de ombros: ela estava tendo a experiência que desejava.
> Isso acaba aqui – falou se virando para o anjo caído, a voz dura e afiada como uma lamina. - Vocês, v?o! – ordenou.
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As mulheres a observaram em dúvida, evitando olhar diretamente para HasMut. Uma delas, a demiana que ainda tinha algo no olhar, se levantou, como para obedecer éfrera, mas a um olhar do anjo seu olhar caiu e ela voltou a se ajoelhar novamente, as asas trêmulas às costas.
> Vocês me ouviram – ordenou novamente éfrera. - Eu e esse maldito vamos ter uma conversa. Se quiserem, se for a vontade de vocês, depois poder?o voltar. Acho que você n?o se oporá a isso, n?o é mesmo, HasMut? Ou você está com medo? – desafiou.
O anjo a observou detidamente, o ódio fazendo seus olhos tomarem um tom avermelhado.
- Tudo bem. Vocês podem ir, por agora. Quando eu acabar com isso aqui e chamar vocês de volta, voltem imediatamente.
Ouvindo isso as dez mulheres, mais que rapidamente, se levantaram e saíram do aposento sem olhar para trás.
> Acha que pode ser contra mim, éfrera?
A demiana n?o falou nada, mas apenas sacou a espada, apoiando-a ao lado do corpo, os olhos seguindo os mínimos movimentos do anjo. HasMut estreitou os olhos, preocupado. Sabia que éfrera, quando estava para atacar, ficava em total silêncio, toda concentra??o. Por que conversar com os mortos?, a ouvira dizer em inúmeras ocasi?es.
> Pois eu tomaria cuidado. Sei onde está seu namoradinho. Posso ir até ele e matá-lo vezes sem conta, assim que ele come?ar a ter alguma consciência. Você sabe que eu posso fazer isso.
éfrera se virou, um sorriso maldoso no rosto, assim que dois asseclas de HasMut assomaram no pórtico. Os dois ent?o pararam, e examinando a situa??o retraíram as garras e se postaram tranquilos, assumindo a posi??o de observadores, para consterna??o de HasMut.
éfrera sorriu, voltando-se para o anjo. Será que ele ainda demoraria muito a aprender como tratar aqueles que est?o ao lado, se perguntou, vendo, feliz, que ele finalmente fazia o espor?o assomar.
Suspirou. N?o gostava de falar com os mortos, se justificar para eles, mas via que ele iria precisar muito disso.
- Veja, HasMut, parece que você está se esquecendo de algumas coisas. O que chamou de meu namoradinho escolheu suas experiências, e as aceitou de livre vontade. Se for parte do acordo que seja torturado e morto vezes sem conta, que seja, n?o está em minhas m?os, a n?o ser respeitar a vontade manifestada. Agora, quanto a você e a mim, a coisa muda de figura. Sabe, como n?o é uma escolha livre sua, cada vez que morre você fica mais pesado, e mais e mais se esquece de quem é e do que quer ser e fazer. Ou seja, você vai esquecer, cada vez mais, que é um anjo. Ent?o, aí sim, será muito fácil te achar, te torturar e te matar, te mandando sempre para o final da fila da reencarna??o. Mas, nem mesmo isso vai merecer de mim. Há outros, que você treinou para buscar o seu mal e a sua ruina. Vou matá-lo agora, e fazê-lo cair bem fundo. Eles cuidar?o do resto.
éfrera viu o momento em que o horror tocou o cora??o do anjo. As bordas do manto puído tremeram, juntamente com o espor?o.
éfrera, maldosamente, lhe deu o tempo para que entendesse, para que todo seu infortúnio lhe pesasse.
> E assim, meu amigo, vem o seu karma. Você criou as suas dívidas, como criou a necessidade de resgatar suas culpas – sorriu, levantando a espada e se preparando para atacar.
O grito do anjo, revoltado e apavorado, ecoava ainda quando o corpo desabou no ch?o.
- Vocês dois – chamou a aten??o, - recolham o resto do corpo dele que n?o se desfizer e joguem para os porcos. Depois, v?o até Zardael e digam-lhe que a responsabilidade agora é dele, de conduzir os caídos e os outros deste acampamento.
- Assim será feito, éfrera. E o que diremos sobre você?
éfrera os olhou, enquanto guardava lentamente a espada.
- De mim nada será necessário. TendaVar, meus amigos.
- TendaVar, éfrera, respondeu cada um por sua vez, acompanhando o cumprimento com um movimento do tronco, em deferência à guerreira.